Hoje cedo encontrei um amigo na caminhada, e ele está bem pouco otimista com a COP30. Não só ele, muita gente está. “Não vai solucionar nada”; “não se discute o que realmente importa”; “não tem assento para os mais vulneráveis, que são os primeiros a sofrer os impactos”; “o país mais poluidor, Estados Unidos, não está representado, então do que adiantará fazer qualquer acordo?”.
São motivações justas, todas elas. Mas tem também o “outro lado”, que não responde a todas essas questões, mas que podem ser sementes de novas possibilidades de pensamento. Apego-me a tais sementes para ampliar minhas chances de analisar o grande imbróglio da civilização de hoje.
Por exemplo: acaba de sair a Declaração da Cúpula dos Povos Rumo à COP30. Como são muitos os momentos da Conferência, nem todo mundo se deu conta de uma enorme Marcha Mundial pelo Clima que aconteceu pelas ruas de Belém neste domingo. Cerca de 70 mil pessoas desfilaram toda a sua diversidade pela cidade que hoje recebe líderes e negociadores de todo o mundo. Não é pouca coisa.

A marcha foi organizada por integrantes da Cúpula dos Povos e da COP das Baixadas, e teve a participação de representantes de organizações de todos os continentes, de povos tradicionais e das comunidades paraenses. E lá estavam a ministra Marina Silva, do Meio Ambiente e Sonia Guajajara, dos Povos Indígenas, endossando a caminhada da sociedade civil.
No texto da Declaração que se seguiu à marcha há pontos tão sensíveis quanto verdadeiros. Impossível deixar passar em branco, por exemplo, que “o avanço da extrema direita, do fascismo e das guerras ao redor do mundo exacerba a crise climática e a exploração da natureza e dos povos”. Denominadas como “exigências”, há outras questões que também devem receber atenção dos negociadores.
É preciso olhar para o resultado dessa enorme organização. Se isso não for feito, há chance de aumentar o fosso entre a retórica dos gabinetes da COP e a fala do povo das ruas. O documento está aberto, pode ser acessado por quem tiver curiosidade. É um dos pontos positivos da Conferência. Mas tem outros. E nem é preciso botar as lentes cor de rosa para vê-los.
Na coletiva de imprensa do final do dia 12, com o presidente da COP30, André Corrêa do Lago e a CEO Ana Toni, o assunto principal foi sobre novos empregos e habilidade dos trabalhadores dentro da nova economia. Foi lançado um estudo – “Jobs and skills for the New Economy” – desenvolvido em colaboração com a presidência da COP30 e parceiros internacionais, que mostra que a transição climática, focada nas pessoas, poderá criar 375 milhões de empregos na próxima década. Será um impacto significativo em quatro setores que foram analisados: energia, construção, manufatura e agricultura).
À mesa da coletiva de imprensa estava Nicholas Stern, economista britânico famoso por ter produzido, com equipe, o Relatório Stern sobre a Economia das Mudanças Climáticas, lançado em 2006. O professor está lançando agora “A história do crescimento do século XXI” (tradução literal), livro que está disponível gratuitamente no site LSE Press.
Stern fez várias autocríticas sobre seu primeiro Relatório, onde reconhecia que “o problema das alterações climáticas envolve uma falha fundamental dos mercados: aqueles que prejudicam outros emitindo gases com efeito de estufa geralmente não pagam”. E estava ali, na mesa, endossando a possibilidade de criação de empregos.
As iniciativas para a adaptação climática serão capazes de gerar alguns milhões de empregos, diz o relatório, sobretudo na gestão de riscos e saúde.
“A partir de investimentos em construção, impulsionados por infraestrutura resiliente em regiões rurais, urbanas, costeiras e de baixa altitude. Outros 105 a 205 milhões de empregos poderiam ser criados nos setores de agricultura e uso da terra, impulsionados por intervenções como resiliência de culturas, pecuária e pesca; preservação de áreas de alta biodiversidade; e conservação e recuperação de ecossistemas terrestres, marinhos e de zonas úmidas.”
Para concretizar esse grande potencial de criação de novos empregos será preciso uma grande concertação entre governos, empresas e instituições financeiras. Se vamos conseguir, é outra história.
Fato é que a segunda semana da COP30 começou com um nível de tensão mais elevado, o que pode ser observado até pelo aumento da segurança nas imediações do centro onde tudo acontece. As negociações avançam do nível técnico para o político. E aí fica mais complicado. No site da COP, uma frase diz tudo: o jogo é jogado até o último minuto.