Há saídas para tantos colapsos?

Minha ideia é procurar saídas, devires, brechas. Não é tarefa fácil, nesse momento de tantos colapsos. Como é meu foco de estudo há duas décadas, tento destrinchar o colapso ambiental, entender melhor o que as pessoas teimam em não entender bem. Hoje pela manhã ouvi um analista político dizer que o Brasil não pode deixar de se desenvolver, porque é isso que os países desenvolvidos querem que aconteça. Tal discurso, igualzinho, ouviu-se muito na Conferência de Estocolmo de 1972, há cinquenta anos. De lá para cá, o país de fato se desenvolveu… até a página dois. Já os danos ambientais estão quase na conclusão final, se estivéssemos falando sobre um livro.

Que tudo o que está acontecendo no Rio Grande do Sul era previsto, sim, era. Que desde 1988, quando foi criado o Painel Intergovernamental de Mudanças do Clima (IPCC na sigla em inglês), os cientistas estão avisando que os eventos extremos serão o novo normal de nosso século, é só revirar um pouco os papéis para descobrir. Falemos, pois, agora que não há mais ponto de retorno:

“Mudar nossa trajetória de colapso requer não apenas parar de destruir a natureza agora, mas nos empenhar em reconstruir, na medida do possível, o que foi destruído desde ao menos a década de 1950”, aponta o professor Luiz Marques em seu livro “O decênio decisivo: propostas para uma política de sobrevivência” (Ed. Elefante, 2023).

É claro que as vidas humanas arrasadas, não só fisicamente mas com o colapso de tudo o que vinha sendo constituído como sólido ao redor, são prioridade no momento. Mas disso estamos cuidando todos nós, solidários, quer seja enviando recursos financeiros, quer seja enviando alimentos e roupas.

Quero me ocupar, aqui, da política de sobrevivência, do que é preciso fazer para naturalizarmos o que foi cimentado. Olhem vagarosamente qualquer foto da destruição que está acontecendo na Palestina. Não há um verde em volta, e isso é muito significativo. Trago uma frase da música “Subterranean Homesick Blues”, de Bob Dylan (1965): “Você não precisa do homem do tempo para saber de que lado o vento sopra”.

Mas, apesar de toda essa introdução pouco otimista, tenho também uma visão do que é possível ser feito. Porque, se não acredito numa única solução para os colapsos que estamos vivendo, por outro lado, creio que há atos que valem a pena.

Neste fim de semana que passou estive na Lagoa Rodrigo de Freitas, no aniversário de uma amiga que fez sua festa num dos quiosques à beira do monumento. Muito simpático. No caminho, dois cartazes chamaram a minha atenção porque eles usavam uma palavra que me afeta: naturalização.

A Lagoa e sua vegetação, agora viçosa, atrai pássaros e outros bichos. Foto: Amelia Gonzalez

Trata-se do projeto de naturalização da Lagoa, ideia do biólogo Mario Moscatelli, que a Prefeitura encampou. O projeto começou em junho do ano passado, e já está pronto. É uma ação bem simples: retirar postes, meio-fio, pista e iluminação, depois acertar a área para a recuperar a flora (grama de mangue, samambaia do brejo, algodoeiro de praia e mangue vermelho) e, por fim, instalar um cercado protetivo e placas informativas.

As tais placas informativas chamaram minha atenção. Parei para ler. Mas fui capturada também pelo som dos pássaros que conseguiam romper o vozerio dos humanos em volta. A Lagoa, num domingo à tarde, ensolarado, atrai muita gente.

Fiquei ali um bom tempo, ouvindo e vendo. A passarada parecia toda animada, tinha ganhado de volta uma vegetação viçosa. Aparentemente, deu certo o projeto de Moscatelli. E não deve ter sido nem tão difícil assim retirar as intervenções urbanas que tinham roubado da natureza um espaço tão primordial.

Mais tarde, comentei com Emanuel Alencar, amigo e colega de profissão que milita no setor do meio ambiente, e pactuamos, via rede social, bons sentimentos  sobre o projeto de Moscatelli. E que bom que o poder público teve sensibilidade para levar adiante.

Luiz Marques, de novo, em consonância com o que eu estava vivenciando:

“Mudar nossa trajetória de colapso requer não apenas parar de destruir a natureza agora, mas nos empenhar em reconstruir, na medida do possível, o que foi destruído desde ao menos a década de 1950. Se os últimos setenta anos foram os anos da “Grande Aceleração”, ou seja, da “Grande Destruição”, os próximos decênios terão de ser os da “Grande Restauração”. É preciso apostar que isso ainda é possível. Essa aposta é, contudo, razoável se, e somente se, como indivíduos e como sociedade globalmente organizada, reagirmos com presteza e à altura do que exige agora a emergência climática e demais emergências socioambientais”.

Busquei notícias sobre o projeto bem sucedido de Moscatelli, poucas achei. Não é de se estranhar. Quem se interessa pelas coisas que dão certo e podem ser replicadas? Poucos. E a mídia precisa de muitos olhares, muitos likes, muitas análises, críticas positivas ou não. Estamos num emaranhado, imersos, quase viciados em histórias pungentes, dramáticas. Ao mesmo tempo que somos atraídos, elas nos extenuam, nos deixam de ressaca, e aí só mesmo assistindo a doramas ou a filmes de ação violento para expurgar a droga.

Mas no britânico “The Guardian” encontrei um texto que dialogou com algumas das minhas reflexões. A autora é Adriana Matei, e ela traduz a angústia que às vezes me persegue: ter microresponsabilidades com o ambiente no entorno pode tirar da grande indústria o papel que ela tem, teve e terá no colapso ambiental?

Matei sugere a leitura do livro “One Green Thing”, de Heather White, que mais me parece uma auto ajuda para se tornar uma pessoa verde. Mas acredito em sua proposta: ““A ação individual impulsiona a mudança cultural e, sem mudança cultural, as políticas globais e as soluções de mercado não funcionarão. ”

De alguma forma, os meus cuidados com o entorno são, ao menos, percebidos por alguém da vizinhança que seguirá pensando sobre o assunto. E isso é bom. Se me consola ou me tranquila com relação a tudo que estamos  e estaremos vivendo nos próximos anos? Não. Definitivamente, não.

A minha droga preocupante é o discurso que relatei no início do texto, que envolve ainda a dicotomia desenvolvimento versus preservação. Não vejo a menor possibilidade de continuarmos o desenvolvimento tipo business as usual sem assistirmos a catástrofes ambientais cada vez mais intensas. E, para quem ainda não percebeu, vale o alerta dado pelos cientistas do Inmet: a onda de calor e a seca que estão aqui no Rio de Janeiro e em outras partes do país também são eventos climáticos. E, caso continuem, também vão impactar fortemente a agricultura e a saúde humana.

Invoco Félix Guatarri para me ajudar a dar um sentido final a esse texto, que não deve concluir nada. Apenas convido a refletir. Nascido na França, em 1930, Guatarri foi filósofo, psicanalista, psiquiatra, semiólogo, roteirista e ativista revolucionário francês. E escreveu um livro chamado “As três ecologias” em 1989, que não me canso de consultar. Um ano antes do lançamento dessa obra, os cientistas inauguravam o IPCC. Visionário, Guattari traz a questão ecológica bem centrada dentro de outra questão, fundamental, a desigualdade social. A luta de classes. E avisa:

“Menos que nunca a natureza pode ser separada da cultura, e precisamos aprender a pensar transversalmente as interações entre ecossistemas, mecanosfera e universos de referência sociais e individuais”.

Sigamos refletindo.

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O mundo contra a fome? Ou o mundo a favor das armas?

“O caráter fundamentalmente tautológico (repetição desnecessária) do espetáculo decorre do simples fato de os seus meios serem ao mesmo tempo a sua finalidade. Ele é o sol que não tem poente no império da passividade moderna. Recobre toda a superfície do mundo e se banha indefinidamente na sua própria glória”

Guy Debord em “Sociedade do espetáculo”

Pelo quinto ano consecutivo aumenta o número de pessoas que enfrentam altos índices de insegurança alimentar no mundo. Num informe publicado ontem, a agência da ONU para a Agricultura e a Alimentação (FAO) deu conta de que existem 281,6 milhões de pessoas com desnutrição aguda  no mundo. Dessas, 36 milhões está à beira da morte por conta disso. E há 800 milhões em situação de insegurança alimentar.

Aqui no Brasil, felizmente por conta de políticas sociais do atual governo de Lula da Silva, a realidade está melhorando. Ainda assim, existem 8,7 milhões de pessoas que enfrentam a insegurança alimentar. As informações são da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNADC), divulgada hoje pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

No cenário global, os países que têm o maior número absoluto de famintos, são majoritariamente do continente africano: Repúblia Democrática do Congo, Nigéria, Sudão, Etiópia e um do continente asiático, o Afeganistão, um dos países mais pobres do  mundo, que foi atacado pelos Estados Unidos durante vinte anos, cuja economia é focada na produção e exportação do ópio.

Gaza tem 100% de famintos hoje, quando tem sido cruelmente atacada por Israel. Há mil pessoas que estão tentando chegar em Gaza, via marítima, partindo de Istambul, no projeto chamado “Flotilha da Liberdade”. Estão retidos, há ameaças de que talvez sejam interceptados. Eles levam toneladas de alimentos não perecíveis, medicamentos e profissionais que podem ajudar. Para saber mais, clique em https://www.instagram.com/reel/C6I5NB-IL4c/?utm_source=ig_web_copy_link&igsh=MzRlODBiNWFlZA==.

Na América Latina, a fome extrema atinge as populações do Haiti, da Bolívia, da Colômbia, da República Dominicana, de El Salvador, da Guatemala, de Honduras e da Nicarágua. As informações são da coluna do jornalista Jamil Chade no UOL. É onde os leitores ficam sabendo que a situaçao de insegurança alimentar que persiste no mundo abala os planos da ONU, de erradicar a desnutrição até 2030.

A pergunta que fica é: além das promessas e compromissos firmados diante dos holofotes espetaculares que iluminam as reuniões globais em torno de um desenvolvimento mais igualitário, justo e que leve em conta os impactos dos eventos extremos aos humanos mais pobres, o que mais tem sido feito para assegurar os planos das Nações Unidas?

É preciso um esforço coletivo, com compartilhamento de recursos? Bem, é preciso saber que, ainda segundo Chade, “nesta semana, um levantamento revelou que, em 2023, governos destinaram US$ 2,4 trilhões para suas forças armadas”. No mesmo período, o Banco Mundial alocou US$ 45 bilhões para combater a fome. E na ONU, toda a ajuda humanitária para as piores crises do planeta foi calculada em US$ 54 bilhões.

Do que é que estamos falando, verdadeiramente?

A foto que usei para ilustrar este post é de um documento antigo que tenho guardado. Trata-se do rascunho zero do texto final, assinado pelos países das Nações Unidas que se uniram no Rio de Janeiro, em 2012, e fizeram a Conferência Rio+20.

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Amelia vive!!!

Era uma vez uma esquina.

Ora bolas, mas como esquinas são seres inanimados, sinto que vou precisar dar mais detalhes para chamar a atenção dos meus leitores.

Então, vamos lá: era uma vez uma esquina, num bairro do Rio de Janeiro que já foi mais estiloso do que é atualmente.  Por essa esquina circulava, de maneira livre e feliz, como se num sítio estivesse, uma bela galinha preta.

Agora ficou mais interessante a história, né?

Pois bem. Com uma certa frequência eu usava aquele caminho para fechar um circuito de caminhada em dias de tempo livre. Eu e Beto, meu cachorro, que não dava a menor bola para a galinha. Eu é que a achava simpática e ficava com o coração aos pulos quando a via ciscando, tranquila, mas bem próximo aos carros. Ali não tem esse horror de alta velocidade porque a esquina fica no fim de uma ladeira e tem uma curva bem fechada. Mas, como a calçada é reduzida, a galinha ficava pertinho das rodas. Ela, nem aí. Eu, aflita. Ai, ai, e se acontece o pior? Coisa de humanos que se pré-ocupam dos acontecimentos.

Como toda a história, essa também tem um clímax. Vamos a ele.

Lá um dia, descendo a ladeira com Beto, eu ouço alguém chamar meu nome: “Amelia!”. Em alto e bom som. Olhei para um lado, olhei para o outro, ninguém acenava para mim, como seria de se imaginar que fizesse uma pessoa a chamar o nome de outra. Andei mais alguns passos, e ouvi de novo: “Amelia!’. Ah, aí eu parei e fiquei olhando para a rua, curiosa e atenta. Ninguém estava passando. Por ali, só a galinha preta e… uma senhora de dentro de uma casa, na calçada onde a galinha preta ciscava, solene e feliz.

Sim, se vocês imaginaram que a galinha preta se chamava Amelia, acertaram.

Agora, podem imaginar também meu espanto?

Amelia não é um nome comum. Nunca partilhei a lista de presença com outra Amelia em toda a minha vida escolar. E é um nome de pessoas idosas, que herdei de minha avó materna. O meu Amelia não tem acento porque meu pai não reparou na hora do registro de nascimento, portanto eu gosto de marcar essa diferença, e insisto com quem assina por mim: “Sem acento, por favor! Senão, não sou eu!”. Só de cisma mesmo… E quem poderia imaginar que, um dia, eu compartilharia esse nome idoso e ortograficamente desfalcado, com uma linda galinha preta que ciscava, feliz, num ambiente totalmente urbano, sem perturbar a vida de ninguém e sem ser perturbada?

Certa de que eu tinha feito um achado, no dia seguinte compartilhei a novidade com minhas colegas de hidroginástica. Faço o exercício numa academia perto da calçada de Amelia (que será chamada assim de agora em diante). E, qual não foi minha surpresa, quando percebi que não era novidade alguma. Todo mundo sabia que a galinha preta, nossa quase vizinha, se chamava Amelia. Só se esqueceram de me contar, ok, tudoi certo.

E fiquei sabendo mais da história de Amelia. Uma história que pode ter outras tantas versões, é claro, porque não tem um único dono. É como Amelia. A história será contada, então, no subjuntivo.

 Ela teria aparecido por ali jovenzinha, talvez fugindo de alguma panela, e gostara daquele canto. A moça que mora numa casa de sobrado cuja porta dá para a calçada de Amelia, não se incomodou com a presença da nova vizinha, respeitou, e passou a oferecer um teto para Amelia descansar à noite, quando toda galinha gosta de se aninhar em algum galinheiro.

Aqui, faço um parênteses, porque estou falando, obviamente, das galinhas felizes, que têm a sorte de Amelia por terem espaço para ciscar, não daquelas pobres criaturas que vivem dentro de gaiolas de aço e só existem para serem engordadas e depois são mortas para alimentar seres humanos e outros animais. Aquelas, das grandes corporações alimentícias. Até me dá tristeza de pensar… deixa pra lá.

Pois Amelia, então, passou a ter uma rotina bem tranquila. Durante o dia ela ciscava, à noite entrava em casa, onde a vizinha tinha até arquitetado um cantinho só para ela. Em contrapartida, Amelia livrava toda a vizinhança da praga de escorpiões, já que, como sabemos, as galinhas são predadoras de escorpiões. Tá bem, não vou garantir que a esquina de Amelia seja um antro de escorpiões, mas nunca se sabe. Portanto, se aparecesse algum, não teria vida longa.

Ah, e tinha outro pagamento que Amelia dava a seus protetores. De vez em quando ela deixava um ovo ou dois, que eram saboreados pela vizinhança.

E o tempo foi passando. Já sabendo de nossa característica comum, sempre que meu caminho se cruzava com o de Amelia, eu a olhava com muito mais carinho. Poxa, afinal, não é todo dia que a gente encontra uma homônima de dois pés e bico comprido. Gostei. E, baixinho, quando passava por perto, eu lhe dizia: ‘E aí, xará! Como a vida anda lhe tratando?” E saía rindo.

Mas um dia…

Por que todas as histórias precisam ter um final? E por que os finais, em geral, têm a ver com finitude?

Recebi a notícia do sumiço de Amelia. Quem me contou foi Maitê, professora da minha hidroginástica. Há duas versões. A primeira, terrível, conta que um homem a encurralou. Amelia tentou fugir para o seu cantinho, não conseguiu. O monstro torceu o pescoço de Amelia ali mesmo e a levou.

Da segunda versão, eu gosto mais. Amelia teria lutado, se debatido, mas o homem somente a levou, ainda viva, talvez para botar seus ovos para alguma família que necessite deles.

Mas, de uma forma ou de outra, lá se foi Amelia, cumprir seu destino. De maneira trágica, se a primeira versão estiver correta, ou talvez ainda lhe sobre um tempo para ser feliz em outro canto.

Passei a mandar um olhar comprido, com alguma tristeza, para a calçada de Amelia. Não sei quanto tempo ela viveu ali, mas não importa muito essa informação. Viveu o tempo necessário para despertar um sorriso que fosse nas pessoas que descem apressadas a ladeira, preocupadas com tantas coisas que já não se dão tempo nem de respirar de verdade, quanto mais de olhar para o lado e ver que esse mundo não é só dos humanos.

A cereja do bolo dessa história vem agora.

Passeando por ali, na tarde deste sábado (dia 20) vi duas pessoas pintando o muro da calçada da Amelia. De longe, não dava para perceber. Mas, quando cheguei bem pertinho, vi a homenagem que o artista plástico Odylo Falcão, mestre da arte urbana, que enfeita nosso bairro de cores e alegria, estava fazendo à Amelia. É a foto que enfeita este texto.

O mural ainda não está pronto, tanto que ainda não tem a assinatura do mestre. Mas eu não aguentei, e trouxe aqui para vocês a história, com a cereja do bolo. Veja na foto abaixo, ainda inacabado.

Amelia vive!! Para mim, sem acento em seu nome. Assim me sinto mais ligada a ela.

A foto foi feita pela colega Barbara, da minha turma de hidro.
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Um texto de cinquenta anos provoca reflexões nos atuais habitantes do planeta

“São os homens simplesmente primatas superiores e, como tais, sua importância não é maior que a de outros componentes dos ecossistemas naturais? Ou o Homem ocupa um lugar especial na Natureza”?

A frase está na introdução do livro “Uma Terra Somente”, publicado em 1972. Trata-se de “um extrato de aproximadamente 400 páginas de correspondência, oriundas de 40 países… dos pontos de vista conceituais que expressaram a respeito dos problemas a serem discutidos na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente Humano” que, como se sabe, aconteceu em Estocolmo. A riqueza de detalhes do texto, finalizado pelos ambientalistas Barbara Ward (1914-1981) e René Dubos (1901-1982), abre algumas janelas de reflexão, que quero compartilhar com vocês.

O pensamento principal que ocorre depois da leitura do livro é: se, há mais de meio século, estamos lidando com a perspectiva de que seria necessária uma mudança de rumo para garantir o bem viver de todos os homens no planeta, por que não conseguimos evoluir nesse sentido? Que se registre um fato insofismável: a tecnologia, que para muitos tem sido apontada como a bala de prata, é eficaz só para a turma que habita o primeiro andar da pirâmide social.

Minha pergunta é apenas o caminho para ampliar os pensamentos, já que, de fato, é impossível encerrar o debate numa resposta. São várias possibilidades, isto sim, e todas desaguam na mesma questão: é preciso ter capital. E o poder que o capital empresta às nações e às pessoas.

PIB sobe e é bom para quem?

No momento exato em que se lê, nas principais manchetes, que o Produto Interno Bruto (PIB) de um país vai aumentar, as reações da sociedade são de regozijo. Faz sentido, afinal. Um PIB mais alto significa que o país entrará para um patamar econômico mais aceitável. E estará, assim, mais aberto a receber mais investidores. Ocorre que, a despeito de toda tecnologia que hoje temos disponível, a maioria dos grandes investimentos causa impactos sérios ao meio ambiente.

 À sociedade civil, que sente os impactos na ponta, resta tentar alertar sobre o problema. Mas… em geral, as queixas ficam no ar. Porque, não custa repetir, o senso comum não percebe que um PIB elevado, muitas vezes, quer dizer maus tratos ao meio ambiente. E forte impacto às terras indígenas e aos povos ribeirinhos.

Vamos a um exemplo recente disso, dos muitos que se acumulam. No dia 29 de março deste ano foi lançada a pedra fundamental para o projeto de construção de uma ponte ligando o Brasil à Bolívia. A rodovia deverá conectar áreas produtoras do agronegócio dos dois países aos portos com saída para o Atlântico, na bacia amazônica, e para o Pacífico, principalmente nas cidades de Arica, no Chile, e Illo, no Peru.

No site Infoamazonia,  a reportagem de Fabio Bispo mostra os dois lados dessa  realidade. Por um lado, sim, o negócio promete trazer empregos e desenvolvimento à região, já que vai viabilizar a exportação brasileira ‘a custos mais baixos para outros continentes e países, especialmente para China, que é o principal parceiro comercial da América do Sul”, explica o repórter.

A reportagem ouviu a pesquisadora Marta Cerqueira de Melo que, no entanto, chama a atenção para o fato de que “não se discute esse desenvolvimento dentro de um planejamento estratégico, em como ele vai se relacionar com as populações locais”.

 Na região existem 49 terras indígenas e 86 unidades de conservação, incluindo territórios com presença de indígenas isolados, que certamente sofrerão sérios impactos. Logo, a rodovia será um bom negócio para o agro. Mas é um negócio que em nada ajudará a humanidade a conviver de maneira respeitosa com o ambiente do entorno.

Portanto, com foco nesse caso, nem de longe o único, a resposta à pergunta inicial desse texto é: o Homem (com H maiúsculo como queriam os escritores) se sente no direito de “ocupar um lugar especial na natureza”. E sabemos bem para onde essa desconexão está nos levando.

O pior de tudo é que, enquanto bilionários podem pensar em continuar a vida em outro planeta depois de ajudarem a destruir o habitat que lhes cabe, a maioria precisa se deslocar a pé quando o território que habitam é arruinado pelos eventos climáticos causados pelas emissões de gases poluentes. Uma nova análise divulgada no mês passado pela InfluenceMap revelou que, de 2016 a 2022, 80% das emissões globais de dióxido de carbono foram produzidas por apenas 57 empresas em todo o mundo. Nem precisa dizer que as petroleiras Shell, BP e Chevron estão entre elas.

Mas, antes de levantarmos o dedo acusatório, com legitimidade, para as corporações poluidoras, seria uma boa ideia que refletíssemos sobre a nossa real disponibilidade de mudar nossa cultura, muito baseada em combustíveis fósseis. Já imaginou um mundo sem plásticos, por exemplo?

Costumo dizer que não tenho respostas, mas muitas perguntas. Considero que formular perguntas é mais importante do que encontrar respostas. Na formulação das perguntas podemos ganhar tempo e subsídios para refletir sobre as mudanças que podemos tentar fazer, como tentar fazer, o tipo de resultados que esperamos. Queremos mudar para ajudar a humanidade, o planeta, ou ao nosso próprio dia a dia, que ele não seja importunado?

Ou… tudo isso junto e misturado?

Não chega a ser um alento, mas vale a pena saber que essas questões não nasceram agora, não têm a ver com redes sociais nem foram forçadas pela Inteligência Artificial. Ao contrário disso.

Volto ao livro que citei no início deste texto, que se deve ler com bastante respeito e atenção, não só porque foi escrito por pessoas sensíveis e estudiosas, como porque traça um cenário, já assustador, dos rumos da humanidade. Se tivessem sido levadas em conta as observações ali  descritas, possivelmente hoje estaríamos menos crucialmente espremidos entre a preservação e o desenvolvimento. Pincei um trecho que me parece bem interessante para terminar este artigo.

“Hoje, à medida que entramos nas últimas décadas do século XX, há uma sensação crescente de que algo de fundamental e possivelmente irrevogável está ocorrendo com as relação do Homem com seus dois mundos (o natural e as instituições). Nos últimos 200 anos e com hesitante aceleração nos últimos 25 anos, o poder, a extensão e a profundeza das intervenções do Homem na ordem natural parecem pressagiar uma nova época revolucionária na história humana, talvez a mais revolucionária que o pensamento possa conceber. O Homem parece, numa escala planetária, estar substituindo o controlado pelo incontrolado, o elaborado pelo rústico, o planejado pelo fortuito. E isso está sendo feito com uma velocidade e uma profundeza de intervenção desconhecidas em qualquer época anterior da história humana”.  

*Este texto foi publicado, originalmente, no site da Escola Monte Alegre

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Tuvalu, prestes a ser engolida pelo mar, quer ser a primeira nação digital do planeta

Com pouco mais de onze mil habitantes, a pequena nação-ilha do Pacífico, Tuvalu, está pleiteando tornar-se a Primeira Nação Digital do mundo. A ideia é de Simon Kofe, ex ministro dos negócios estrangeiros do país, que defende sua invenção de maneira insofismável:

“As leis internacionais agora precisam lidar com nuances, como os níveis do aumento do mar, que  ameaçam fazer desaparecer nações como Tuvalu. O requerimento convencional para um ´território definido´ está, assim, sendo desafiado. Necessita uma reavaliação’, defende ele.

A primeira vez que ouvi falar sobre Tuvalu foi em 2009. Eu editava o caderno “Razão Social”, encarte do jornal  “O Globo” sobre desenvolvimento sustentável, e fazia a cobertura das Conferências das Partes sobre o Clima (COPs), que hoje são famosas, mas na época não eram. A COP15, que aconteceu em Copenhague, teve como novidade o presidente Obama, democrata recém-eleito dos Estados Unidos, esperado com ansiedade pelos ambientalistas.

Reprodução : Romaine W/Shutterstock
 

A expectativa era que Obama ancorasse a assinatura de um tratado que substituísse o de Quioto, que estipulara metas de redução de emissões de carbono mas não chegara a ser assinado pela nação mais rica. A cúpula de 2009, no entanto, fracassou nessa ambição e frustrou o mundo quando terminou sem um acordo a respeito da necessidade de que o aumento na temperatura global não ultrapasse os 2° C no fim do século. Aqui vale um parênteses: em novembro do ano passado, segundo o Serviço de Monitorização das Alterações Climáticas do Copernicus (C3S), já atingimos os 2° a mais, mesmo com o Acordo de Paris assinado em 2015.

Fecha o parênteses, voltando a 2009: enquanto os negociadores da COP15  tentavam furar bloqueios, a sociedade civil fazia barulho em Copenhague, onde acontecia a conferência. A recém-criada 350.org , que chama atenção para o limite suportável de partículas de carbono na atmosfera (já passamos muito disso), ajudou a organizar uma manifestação  na entrada do Bella Center, onde os líderes se reuniam. Jovens tuvaluanos aproveitaram os holofotes mundiais para gritar palavras de ordem e espalhar ao mundo a angústia de pertencer a um dos países do Pacífico condenados a desaparecer por causa do aumento do oceano, fenômeno causado pelo aquecimento global que, por sua vez, é causado pelo excesso de carbono. E eu ouvi seus gritos, mesmo aqui, a mais de dez mil quilômetros de distância.

Daquele dia em diante, nunca mais deixei de acompanhar a história dos habitantes dessa linda ilha. Embora eu nunca tenha ido lá, quase me sinto uma tuvaluana. Adoro suas cores, a intimidade que têm com o mar que será seu vilão fatal. Na sequência, o drama de Tuvalu chamou minha atenção também para a história dos refugiados ambientais, termo criado em 1985 para designar as pessoas forçadas a deixar seu habitat natural por conta de eventos climáticos. Foi assim que, no ano seguinte, em 2010, assistindo ao documentário “Climate Refugees’, dirigido e produzido por Michael P. Nash, as duas histórias se encontraram e eu fiz o link.

Segundo um relatório do Banco Mundial, até 2050, 216 milhões de pessoas em todo o mundo poderão ser obrigadas a se mudarem por seca ou tormentas. Michael Nash mostra, no laureado documentário que fez parte do Festival do Rio daquele ano, a faceta mais dramática, humana, dos eventos causados pelas mudanças climáticas.

Entrevistada pela equipe de filmagem, uma dona de casa tuvaluana dá um depoimento que jamais esqueci. Ela começa contando sua rotina, que incluía plantar e colher, no terreno de sua casa, os alimentos que consumia. Mas a água do mar tornara a terra salgada, portanto imprópria para essa prática. Além de contar com ajuda humanitária, uma das soluções para a dona de casa seria migrar para a vizinha Nova Zelândia, mas aquele país impunha limites para receber habitantes de Tuvalu: a pessoa tinha que ter até 45 anos, e uma profissão.

“Estão me condenando à morte”, disse ela, num desabafo realista.

Hoje a situação é outra. O país que está “abrindo as portas” para os refugiados de Tuvalu é Austrália, liderado pelo primeiro-ministro Anthony Albanese. O governo australiano se compromete a receber 288 cidadãos tuvaluanos por ano, num acordo que não deixa bem claro o que será cobrado em troca da gentileza.

Pesquisando sobre o tema para trazer a vocês, chamou-me a atenção a reportagem do jornal britânico “The Guardian’, de novembro do ano passado. Trocando em miúdos, a Austrália concede a graça em troca de se tornar uma espécie de guardiã de Tuvalu. Isso equivale a um veto australiano à celebração de acordos de segurança com outros países.

Como pano de fundo, a briga fica entre reconhecer Taiwan como país independente, o que  o novo governo tuvaluano parece preferir, segundo reportagem da Al Jazzera, ou aceitar a proteção da China. Austrália chega oferecendo o ombro amigo, desde que Tuvalu não se aproxime dos chineses.

Há ainda um outro pano de fundo, que seria o fato de que, uma vez “nas nuvens’, a nação ilha, mesmo tendo desaparecido fisicamente, continuaria tendo direito às suas 200 milhas. Por consequência, à pesca de atum, frequente na região. Follow the money, pois.

Independentemente da situação geopolítica que esteja sendo a bússola atual, fato é que o novo governo de Tuvalu tomou posse em fevereiro deste ano, e dele não faz parte o ministro Simon Kofe, que estava na luta por tornar seu país digital. Doze nações já tinham se tornado parceiras no projeto que, se prosseguir, de fato vai ser uma espécie de cartão de visitas da nossa incapacidade, da nossa era antropocena.

Ano após ano, países se juntam para tentar legitimar novos padrões de produção e consumo  que permitam frear um pouco as emissões de carbono que tanto mal estão causando à humanidade. Vejam bem, eu não disse ao planeta, porque este vai prosseguir mesmo depois que a raça humana assumir seu lugar como a única raça capaz de destruir seu próprio habitat.

Termino esse texto com a fala do ministro Kofe, que proporciona uma triste, mas necessária, reflexão. Não a todos, porque infelizmente sabemos que nossa civilização também é composta por indivíduos que dão de ombros e seguem, e seguirão, vivendo o hoje sem respeitar o ambiente.

“Senhoras e senhores, imaginem-se de pé no último caminho de terra que você pode chamar de casa. Imaginem-se vendo este caminho desaparecer debaixo dos seus pés. Isto não é um pesadelo distante: é uma realidade iminente para o meu povo em Tuvalu”.

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A desigualdade e seus métodos

Se você acha que o mundo está desigual demais, espere até saber disso. Uma pesquisa feita por uma empresa britânica, a Knight Frank, demonstrou que, ao longo da próxima década, ocorrerá uma transferência massiva de riqueza, à medida que a geração silenciosa e os baby boomers entregarem as rédeas aos millennials, nome dado às pessoas nascidas entre 1981 e 1995.  A mudança fará com que 90 bilhões de dólares em ativos sejam transferidos entre gerações apenas nos Estados Unidos, tornando os millennials ricos,  a geração mais rica da história.

A notícia foi dada pela colunista Marta Gil, do jornal britânico “The Guardian”, e ela revela que tal transferência de renda vai agravar um dos maiores problemas que já nos ronda. Ou seja, o fator determinante do sucesso da geração millennial é, cada vez mais, se a pessoa nasceu rica ou não. E isto vai perpetuando a desigualdade.

Solução? Pasmem: a colunista fala em imposto sobre herança, um assunto que rondou os representantes dos países ricos nas reuniões prévias do G20 que aconteram no Rio de Janeiro no mês passado. Nosso ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a criação de uma tributação progressiva para bilionários, o que pode ser mais ou menos a mesma coisa.

Sabem o que é mais interessante em toda essa história? Em janeiro de 2020, portanto ainda antes da pandemia de Covid-19, o Fórum Econômico Mundial de Davos, reunião de líderes empresariais e chefes de nações que acontece anualmente na Suíça, recebeu uma carta assinada por 120 milionários e bilionários do mundo, destacando os efeitos nocivos da desigualdade e exigindo impostos mais altos para os ricos, além de um esforço internacional para acabar com a evasão fiscal.

De lá para cá, todos os Fóruns de Davos – eles acontecem anualmente –  recebem uma carta parecida. A imprensa cobre, analistas analisam, e tudo continua como dantes. Talvez o texto desta colunista  britânica, publicado ontem no “The Guardian”, esteja sinalizando alguma mudança, em algum nível, em alguma medida.

Não quero ter esperanças, mas reproduzo aqui a fala de Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil, a quem procurei para compartilhar reflexões em 2020. A Oxfam é uma organização voltada, entre outras coisas, para analisar a questão da desigualdade social no mundo. Anualmente, lá mesmo no Fórum de Davos, a Oxfam publica uma pesquisa sobre o tema. Neste ano, o estudo publicado conclui algo parecido com o que Marta Gil denuncia:  uma nova aristocracia econômica está surgindo.

“A riqueza dos cinco maiores bilionários do mundo dobrou desde 2020, enquanto a de 60% da população global – cerca de 5 bilhões de pessoas – diminuiu nesse mesmo período. Se o cenário geral não mudar, em dez anos teremos o primeiro trilionário, mas só conseguiremos acabar com a pobreza em 230 anos!”, diz o relatório da Oxfam, que pode ser lido em profundidade aqui.

Bem, mas se os super ricos estão escrevendo até carta para pedir que sejam taxados, se o ministro Haddad endereçou a questão na reunião do G20, será mesmo que não se pode ter esperança de que a situação possa ser revertida?

Com a palavra, Katia Maia:

“Esta carta, em resumo, diz o seguinte: vejam a que ponto chegamos, em termos de desigualdade no mundo. Tem uma parte dessa turma de milionários e bilionários que está mesmo impressionada com o nível de riqueza que está gerando riqueza em cima de riqueza. Essas pessoas estão, realmente, se assustando. Veja o Bill Gates, por exemplo: ele dobrou a fortuna dele desde quando saiu da Microsoft até agora. Isto é resultado de juros sobre juros, lucros, dividendos. Não é produção, não é valor agregado para a sociedade. É só riqueza gerando riqueza! Acredito que esta carta pode ter o efeito de avançar nesse debate. É animador”

Considerando que esse depoimento foi de 2020, e que estamos vivendo um cenário onde há mais pessoas, além de cartas, pensando em formas para diminuir a desigualdade, talvez seja mesmo um aditivo para nossa esperança. Vamos acreditar nele.

  • Este texto foi primeiramente publicado no site da Escola Monte Alegre.
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Exposição usa sentidos, afeto, simpatia, para aproximar o público do meio ambiente

No universo da atualidade, onde reinam as “tendências”, não sei se posso chamar assim o fato de, recentemente, chegarem a mim escritos e outras formas de comunicação,  trazendo para o campo das emoções as muitas sequelas que nosso rastro está deixando no planeta. Nós, os humanos, seres mais predadores, única espécie capaz de destruir seu próprio habitat. Nós, a humanidade, diante do maior desafio de todos os tempos: os efeitos causados pelas mudanças do clima.

A pergunta recorrente é: o que podemos fazer? Abre-se uma espécie de caixinha, da qual saem reações as mais diversas e singulares.

Há quem aposte no acúmulo de dados e informações. Tantas toneladas de emissões de carbono a mais do que nos tempos da Revolução Industrial e muito mais do que somos capazes de suportar; tantos metros a mais de aumento do nível do mar; tantas espécies em risco e já extintas. Uma numeralha que pode servir, para nós, não cientistas, apenas como prova de que, sim, temos sido insensíveis ao meio ambiente. E aí, resta-nos o debate e, não raro, uma indefectível postura dos fracassados diante da tragédia iminente.

Outros, os militantes guerreiros apegam-se à certeza de que ainda é possível mudar, e de que podemos fazer “nossa parte” com pequenas atitudes cotidianas.

 Mas há também aqueles que, acomodados, aceitam o fato de que está tudo muito ruim, mas ainda tem espaço para piorar. São pessoas que estarão sempre por perto para lembrar aos militantes que de nada adianta diminuir o tempo de banho se a indústria está aí gastando água a rodo.

Mas eu falava em nova tendência (para usar a expressão da vez), que pode agregar a esses perfis uma alternativa: a emoção. Percebo, no meu dia a dia de trabalho, que o tema do meio ambiente tem sido revestido com boas sensações, no lugar do tom apocaliptico de sempre. Talvez uma fórmula mais adequada para se conseguir adeptos à causa.

Estou me referindo, por exemplo, à coleção de livros do neurobiologista vegetal Stefano Mancuso, que nos põe em contato com a alma das plantas e deixa os leitores mais sensíveis apaixonados por elas. Falo também sobre o recente livro do colombiano Efrén Giraldo, ‘Sumário das plantas oficiosas”, que faz um relato, além de informativo, bonito, bordando emoção entre as plantas que ocuparam sua vida até hoje. É um livro a ser degustado, como eu disse aqui.

Giraldo me levou a conhecer a linda fábula “O Homem que plantava árvores”, escrita em 1953 pelo francês Jean Giono, mas publicada apenas nos anos 80. Um livro bonito e muito emocionante, que deixa nos leitores um desejo quase irrefreável de sair por aí plantando mudinhas.

Na mesma linha, aceitei o convite e fui ontem ao pré-lançamento para imprensa e convidados, da exposição “Sentir mundo – uma jornada imersiva”, no Museu do Amanhã, que será aberta ao público no dia 30, a próxima terça-feira. Com perdão pela extensa introdução, que achei necessária para localizar o leitor, é sobre esta exposição, um recorte do projeto idealizado e desenvolvido pelo Sensory Odyssey Studio, em coprodução com o Muséum National d’Histoire Naturelle, que vou focar este texto.

A proposta da mostra, criada em 2016 pelo francês Gwenael Allan, Ceo do Sensory Odissey Studio, é justamente “provocar uma energia positiva, que as pessoas saiam com vontade de agir, sentindo-se parte do meio ambiente”. O público alvo, disse-me Gwenael em rápida entrevista que me concedeu, são as crianças. “Mas quero alcançar também a criança que existe em cada um de nós, adultos”.

“Minha motivação, ao pensar a exposição, foi atrair as pessoas que não visitam os Museus de História Natural em todo o mundo. A ideia foi fazer uma produção que ajude a criar um laço afetivo entre o homem e a natureza. Que as pessoas saiam daqui não com culpa, mas com simpatia, com uma sensação de bem estar. As crianças, é claro, são nosso publico alvo, mas queremos atrair os adultos também”, disse-me ele.

A criação de Gwenael Allan, de fato, consegue criar empatia. São três ambientes distintos, mas que dialogam. Logo no início, depois de passar por um corredor escuro que mais parece um trem fantasma, o visitante se encontra no “dossel da floresta”. É um espaço com imagens em 360 graus, projeções em alta definição que vai dando a sensação de estar em cima de uma árvore e  vir descendo nos galhos até o chão.

A segunda área temática nos leva por dentro do solo. Também com projeções, conseguidas com câmeras de altíssima definição  – segundo Gwenael, capazes de obter mil a duas mil imagens por segundo – e microfones altamente sensíveis, o visitante é apresentado a um mundo com seres sobre os quais pouco pensamos. Roedores, fungos, formigas, larvas. Acompanha-se, por exemplo, o momento em que um cogumelo floresce, até seu empalidecimento.

 Meu canto preferido foi o último, chamado de “dança dos insetos”. Se o visitante tiver sorte de ir num dia tranquilo – a exposição vai até junho, tem tempo – e conseguir se sentar para acompanhar as imagens, vai sair extasiado. E sim, é possível criar empatia com aqueles insetos, acompanhar seu movimento de polinização. Trago na mente o momento em que um Louva-a-deus captura uma joaninha e a come como se estivesse degustando um saboroso sanduíche. Abelhas fabricando o mel, pólen sendo aspergido, uma lagarta em seu caminhar, tudo isso você poderá acompanhar, com direito ao som característico de cada movimento. (Vejam a foto abaixo).

Como a proposta é ser uma exposição multissensorial, em todo o trajeto o visitante vai sentir odores variados: grama molhada, floral, musgo. A ideia, segundo Amarilis Macedo, coordenadora de exposições e conteúdos do Museu do Amanhã, foi “mostrar que os aromas fazem parte da comunicação entre os insetos e as plantas”.

“É para ativar nossos sentidos e chamar atenção para a capacidade sensorial da natureza”, disse-me Amarilis.

A rigor, tais saberes ambientais deveriam chegar aos nossos jovens e crianças de maneira natural, pura. Mesmo com toda a simpatia que se possa ter aos bichinhos voadores com os quais passamos algum tempo na sala escura, acaba sendo mesmo através de uma tela que fazemos esse contato. Mas, vamos pensar que é infinitas vezes melhor isso do que expor-lhes imagens de bichos enjaulados, mesmo nesses novos espaços que fingem ser ‘mais humanos’ mas que, no fim e ao cabo, são Zoológicos.

Sendo assim, minha sugestão é: aproveitem esse finalzinho de férias misturado ao período carnavalesco e levem seus jovens e crianças a sentirem o mundo nessa exposição. Na saída, vale parar para ver as caixas entomológicas que o Museu Nacional preparou, resultado de uma boa parceria com a mostra, que já esteve na França e em Singapura. E vale ainda ler, em parceria, alguns dos textos selecionados para fazerem parte do painel informativo da exposição.

Aqui vai o meu texto preferido desse conjunto: “Os cheiros atraem os insetos. Mas os aparatos que as moscas têm para senti-los são diferentes dos aparatos das abelhas”.

E viva a diversidade!

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Um livro que leva à reflexão sobre a relação entre homens e plantas

A leitura de ‘Sumário de Plantas Oficiosas – Um Ensaio sobre a Memória da Flora”, recém-lançado pela Editoria Fósforo, exige delicadeza e tempo. Sim, eu sei que estes são dois grandes desafios para nossa era de poucos caracteres e de muita celeridade. Mas o bônus que se ganha com a leitura que estou sugerindo, não é apenas a leveza do corpo, garantia da respiração mais lenta e da contemplação. O autor, o professor colombiano Efrén Giraldo, borda com as palavras, mesclando em seus desenhos de pura emoção e poesia, as plantas, seus nomes científicos, hábitos e habitats. Assim,  reserva aos litores também um jorro de emoções, fenômeno também pouco usual em tempos de tantas comoções uniformes extraídas sob o manto das representações.

Diferentemente do italiano Stefano Mancuso, pioneiro da neurobiologia das plantas, que nos oferece as entranhas comportamentais da flora, Giraldo vive com elas uma relação desde a infância. E vai contando aos leitores passagens sensíveis de sua história. Um menino criado em Antioquia, na Colômbia, sem recursos financeiros, mas com uma imensa e diversa bagagem de cultura sobre as riquezas naturais.

Caiu-me um cisco no olho, por exemplo, quando ele compartilha a história de um conto de Tomás Carrasquilla, escrito em 1915, que ouviu quando criança e do qual nunca mais se esqueceu. Narra a triste vida de Maria Engracia, uma mulher que só tinha um teto para se aninhar, sem mais nada, sem um enfeite a lhe colorir os dias. Vivia da caridade alheia. Um dia, uma planta quase morta caiu de um caminhão de mudanças, e Maria a recolheu, cuidou dela, a planta reviveu, ficou tão linda que toda a vizinhança vinha visitá-la para ver e comentar a respeito.

Nessa relação entre pobreza e flora, o conto vai anunciando a mudança na vida de Maria Engracia, que também parece ter recuperado o gosto pela vida, já que foi tão gentilmente agraciada pela reabilitação da planta. Àquela altura, ela já tinha uma folhagem e umas flores roxas, belíssimas.

“A história termina quando o dono do cortiço onde ela mora a expulsa e destrói a planta. Maria Engracia adoece e morre de depressão, mas não sem antes ser assistida pela visão da trepadeira, que lhe faz uma espécie de arco para entrar no paraíso”, conta Efrén Giraldo.

Num capítulo inteiro, o professor, que escreveu parte do livro durante o tempo de confinamento por conta da epidemia de Covid-19, exalta a experiência do herbário de Emily Dickinson, a poetisa norte-americana do século XIX, de cuja vida pouco se sabe. Como não dar valor a tanto esmero produzido por uma menina de 14 anos e sua mãe, colhendo e catalogando flores do entorno da casa onde viveu quase reclusa os 56 anos de sua vida?

“Flores, cartas e poemas são mais do que emissários de uma reclusão inexplicável e se convertem na mensagem sempre presente de quem dizia que suas obras eram cartas para um mundo que nunca lhe escreveu”, conta Giraldo.

Já tentei explicar para mim mesma o motivo de um título tão comprido e pouco atraente para um livro tão sensível. Por mais que tenha sido uma certa tendência a buscar leitores poucos e  bons, e se isto é verdade e não uma simples conclusão desajeitada de minha parte, fato é que Efrén Giraldo não chegou a mim, aqui no Brasil, à tôa. Sua obra (sim, uma obra literária) ganhou o prêmio de não ficção Latinoamérica Independiente em 2022. De lá, tomou o mundo… bem, na verdade, rompeu os limites de seu país, foi traduzida para o português e cá está, já morando em lugar cativo e de destaque na minha estante.

Como sabem  os que me acompanham aqui neste espaço (e no blog Ser Sustentável), meu objeto de pesquisa e de estudo é o meio ambiente. Ou o desenvolvimento sustentável, o ecodesenvolvimento… Enfim, a relação do homem com a natureza (evito falar ao redor, porque a expressão já pressupõe que somos o centro) é o que me interessa. Neste sentido, eu me pergunto o valor agregado de um livro que trata das plantas de forma tão poética, à causa do meio ambiente.

Contato. Este é o valor.

O autor tem um estilo quase de diário, em certo momento do livro, levando-nos a caminhar com ele, descobrindo com ele, no entorno de sua casa, as espécies que mais chamam a sua atenção. Aqui e ali ele encontra uma planta que merece uma história. E essa história se entrelaça com a dele:

“As sementes da laranjinha-do-mato ficaram em minha família por gerações e passaram de uma casa a outra, então, quando vejo os pássaros barranqueiros pegando as esferas alaranjadas na ntrada de serviço, imagino que a mão de minha avó ainda abençoe seeu legado através dos arvoredos em que os pássaros cumprem pontualmente sua tarefa de propagação”.

E assim ele vai atestando – sempre com o auxílio de autores que nos enriquecem o tempo todo, tanto que sugiro a leitura desse livro com lápis e papel nas mãos, para anotar as dicas –  o imenso valor nessa relação do homem com a natureza, neste caso ilustrada pelas plantas. É quando eu me pego pensando se não é isto que falta para que, de fato, o aquecimento global, as questões climáticas, passem a ser vistos não como dados meteorológicos apenas, mas como fenômenos intrínsecos ao nosso cotidiano. “Um grau de envolvimento com a natureza que nos faz participar dela”.

Logo no início do livro, Efrén Giraldo confidencia aos leitores como nasceu a ideia do livro: foi quando, em agosto de 2020, por ocasião do 75° aniversário do bombardeio de Hiroshima, ele viu uma reportagem mostrando que árvores sobreviventes à tragédia provocada pelos humanos continuavam a florescer. É nessa resiliência (inexplicável?) que os ambientalistas acreditam quando informam, a quem interessar possa, que o planeta não precisa ser salvo. Ele vai dar seu jeito e sobreviverá a esses predadores humanos que aos poucos vai expulsar.

“A questão é como provocar uma ruptura radical de nossas rotinas para agenciar a transformação das instituições”.

  • Este texto foi originalmente publicado no site da Casa Monte Alegre
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Águas no Rio, lavas de vulcão na Islândia. Onde está o erro da humanidade?

Acompanho, desde cedo, os alertas do prefeito Eduardo Paes à população por causa das fortes chuvas que caem sobre a cidade. As pessoas têm que ficar em casa, o ensaio de escolas de samba, que costuma acontecer no Sambódromo, foi cancelado (ponto positivo para a administração municipal). É preciso evitar as áreas alagadas, que são muitas. A chuva que caiu de ontem para hoje superou, novamente, todos os índices pluviométricos de que se tem notícias até hoje.

Esta foto mostra a situação da cidade islandesa . É do jornal https://www.mbl.is/frettir/

Não vou me esmerar em buscar números para provar que choveu muito. Os Serviços Meteorológicos já estão alimentando as notícias dos sites, fartamente, com esses dados.

O que me interessa aqui, como sempre, é refletir sobre a relação homem/natureza. Ou homem e meio ambiente, expressão que ficou mais forte na Conferência de Estocolmo, 1972, cujo relatório final se transformou num livro de rara riqueza histórica – ‘Uma Terra Somente’, escrito por Barbara Ward e René Dubois – cujo exemplar não sai aqui da minha estante mais próxima.

Naquela época, reunidos em torno de um tema ainda pouco experimentado, líderes das Nações Unidas falavam em “meio ambiente humano’. O livro é uma compilação de tudo o que foi discutido na primeira Conferência mundial sobre o clima, e a folhas tantas há a recomendação:

“Um consultor pede especificamente aos autores de ‘Uma Terra Somente” não permitirem que o corpo editorial reduza o livro a uma simples narração de fatos porque a salvação dependerá, afinal, de um despertar emocional”.

O pedido foi respeitado. E os autores concluem, em quase todo o texto, que “o estabelecimento de um ambiente humano desejável significa mais que a manutenção do equilíbrio ecológico, que o controle econômico dos recursos naturais e mais que o controle das formas que ameaçam a saúde biológica e mental”. Sabe-se hoje, certamente, o que ficou entendido como ‘controle econômico dos recursos naturais’. É o tal desrespeito às leis do ‘ambiente’, que não é apens “humano’, como também já se sabe muito bem hoje.

As chuvas intensas são provocadas pelas mudanças climáticas, e disso ainda não se tinha noção em 1972. Mas naquela época o cheiro de que alguma coisa precisava ser feita para manter a “saúde’ já se sentia forte.

Houve muitos estudos de lá para cá, mas um fenômeno (teria sido inesperado?) atravessou as boas intenções dos líderes da época:  a população mundial saiu dos 4 bilhões para os atuais 8 bilhões, ou seja, o dobro de pessoas habita o planeta, meio século depois. Muita gente junta, sinônimo de problemas, certo?

Não é bem assim. Isto não deveria ser o problema, lembra Barbara Duden,  historiadora médica alemã, estudiosa de estudos de gênero e professora emérita da Universidade de Hannover, em artigo no “The Development Dictionary” (Ed. Z). Duden faz uma retrospectiva sobre a mudança do significado da palavra “população” desde os anos 50.

A historiadora chama atenção para o uso da palavra desenvolvimento, sempre associada a coisas boas, em contraponto ao “uso indevido e injustificado’ da palavra “população”, que se tornou, praticamente, a necessidade de um extermínio das pessoas no planeta.

“População não agrega valores, mas pessoas que se reproduzem, poluem, consomem, produzem e, para o bem comum, precisa ser controlada”, escreve ela.

A conclusão é: o planeta não comporta mais tantas pessoas. Mas, de fato, o que se quer “controlar” é o nascimento de mais pessoas de países pobres. Em vez de construir um planeta possível para oito, nove, dez bilhões (chegaremos lá no fim do século), a ideia é que se contenha, que se refreie o nascimento de mais cabeças que, no fim e ao cabo, podem ajudar, com sua cratividade, a encarar o problema de forma mais humana.

Trazendo novamente o assunto aqui para nosso microcosmo, para a cidade do Rio de Janeiro alagada. Sim, as mudanças climáticas vão intensificar esses fenômenos, o que há muito os cientistas estão alertando. Sendo assim, o que fazer? Um controle de população ou um remanejamento das construções urbanas para evitar que as pessoas morem em áreas de risco, assim como um maior controle do lixo urbano para evitar que os canais sejam entupidos e não deixem escoar as águas da chuva?

Acertou quem marcou a segunda opção. E por que isso não é feito? Bem, aí precisaremos andar mais ainda na História do mundo ocidental, que se apegou a um sistema econômico decididamente a favor da acumulação, não da distribuição de riquezas (e não estou falando, por óbvio, das riquezas naturais).

Prefiro me ater ao presente e apresentar aos leitores um outro caso de descontrole urbano que funciona contra a população. Vamos até o outro lado do mundo, à fria Islândia que, hoje, ao mesmo tempo em que aqui lidamos com o excesso de águas, se apavora diante do fogo que sai do vulcão extinto há oitenta anos.

Um vulcão solta lavas de tempos em tempos, e disso sabemos desde que a humanidade desenvolveu ferramentas para estudar as riquezas do planeta. E por que se constrói uma cidade com lindas casinhas, exatamente no caminho que essas lavas percorrem?

Obviamente eu não tenho essa resposta. Mas tenho direito de imaginar algumas condições que levem pessoas a ocuparem alguns espaços. Graças à tecnologia que me proporciona chance de pesquisar em tempo real os dados que busco, fico sabendo pelo Google que a cidade atingida pelas lavas, Grindavik, tem cerca de quatro mil habitantes. Para não ser injusta com nossos problemas, é bom saber também que toda a Região Norte do Rio de Janeiro, a mais atingida pelas chuvas, tem mais de dois milhões de moradores.

Voltando à Grindavik, fico sabendo, também em fontes de pesquisa da web, que a pesca é seu principal meio de sobrevivência. Mas, vejam só: não estamos falando apenas de pescadores artesanais, que pescam para si e, no máximo, para a vizinhança. Grandes corporações já se instalaram ali, e no bojo, pescam também baleias, cuja pesca é uma verdadeira matança, e só serve mesmo para exportar.

Não, não estou dizendo que o vulcão soltou suas lavas em protesto à matança de baleias. Não chego a esse ponto de pensamento “emocional’, como previam nossos líderes em 1972. O que imagino é que o suporte financeiro que tais grandes empresas oferecem aos moradores locais perto de grandes reservas naturais (baleias incluídas) pode dar uma pista, ao menos, que leve à resposta da pergunta que faço acima.

Quanto à cidade do Rio de Janeiro, por ser um território mais próximo e conhecido, vou ousar fazer uma afirmação, com base na leitura de alguns especialistas: o planejamento urbano está bem equivocado. Se tem pessoas demais, é preciso espalhá-las, criar transporte eficaz para conduzi-las de maneira segura ao local de trabalho. É preciso também oferecer meios para que essa população tenha tudo o que precisa perto de casa (escola, hospital, lazer).

E a lista de melhorias urbanas continua, é grande. Não vamos conseguir parar a intensidade das chuvas, porque já mexemos bastante no meio ambiente (que não é propriedade dos humanos somente, gosto sempre de ressaltar). Mas podemos, com toda a capacidade e humanidade (sim, essa é uma boa palavra), tentar meios para nos equilibrarmos diante dos eventos que virão, sem machucar mais tanta gente.

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Texto curtinho só pra dizer… que bom!

Com a irreverência característica, o carioca apelidou de Caribrejo a Praia do Flamengo depois que ela foi declarada limpa pelos órgãos competentes. Na verdade, o que fizeram foi endereçar para o emissário submarino o esgoto que estava sendo lançado na praia. Não sei o que vai acontecer quando e se um dia o oceano não der mais conta e resolver devolver o “presente’.. Mas hoje não é dia para se falar em catástrofe.

Quero dizer que passei uma boa parte da manhã no Caribrejo, eu e meu cachorro, e voltei de lá com a melhor das impressões. Famílias com crianças e cães, casais de namorados, clima de festa, de confraternização. Tinha lá um pessoal com som de funk bem alto, mas não perturbou.

O mar ensaiou algumas ondas para divertir a criançada e o sol se escondeu, a tempo de nos dar chance de respirar sem aquele calor sufocante. Ou seja: tudo conspirando para que a festa da virada no Caribrejo não fique nada a dever da de Copacabana. Se eu fosse turista, daria uma espiada, até para contar coisas novas sobre o passeio à Cidade Maravilhosa.

E, na volta do passeio, a cereja do bolo: peguei um táxi dirigido por Tina. Cilios postiços, unhas idem, idade que se aproxima ou avança os 60. Falante, pero na medida para não irritar o passageiro. Conversa vai, conversa vem, Tina me conta que faz parte de um grupo de taxistas mulheres. No zap, elas estão sempre se perguntando umas às outras como estão as coisas. E, se alguém desaparece por horas, todo mundo se mobiliza pra saber se alguma coisa de ruim aconteceu com aquela.

É o jeito que encontraram de não se curvarem à violência urbana e ganharem seu sustento.

Fiquei pensando que é assim que tem que ser mesmo. Somos 56% vivendo em cidades no planeta, e essa porcentagem vai aumentar. Cidades são redutos de criatividade, de oportunidades, mas também podem se tornar reduto de violência e maus feitos. Para enfrentar tudo isso, vamos precisar criar saídas. Elas existem.

Um novo ano menos quente, mais solidário, com mais saúde e tempo para contemplar tudo aquilo que, muitas vezes, atropelamos sem fazer contato.

(PS): Não tenho foto para este post porque não ando com celular, só quando estou trabalhando. É meu jeito de não sair perdendo muito se um ladrão cruzar meu caminho.

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