Dia desses, eu me sentei na pracinha aqui do bairro.Não levei relógio, nem celular.

Éramos só eu, Beto, as pedras, algumas moscas, poucas folhas de poucos arbustos.
Rodeados pelo mundo ctônico, como diria Donna Haraway (“Ficar com o problema”) invisível aos meus olhos.
E muitos seres humanos que passavam, iam e vinham. Uns com pressa, outros nem tanto.
O que me levou a me sentar na pracinha foi o frio que comecei a sentir aqui em casa. Moro numa casa onde o sol não chega.
Aqui somos eu, Beto, o computador e minhas lembranças, algumas sob a forma de móveis, outras sob a forma de retratos, muitas sob a forma de livros e muitos enfeites que vou guardando pela vida afora.
Sabe aquelas coisinhas que a gente não consegue jogar fora? Pois é disso que estou falando.
Mas, voltamos à pracinha.
O sol foi me aquecendo, tirei as meias. Senti que o pescoço estava duro, fiz um movimento para soltar. Não sabia muito bem o que fazer com as pernas, ergui-as e fiz pose de Buda.
Sem tela para absorver minha atenção, passei a ouvir minha respiração, a me dar conta dos meus movimentos.
Fiquei assim até que veio uma certa moleza.
Não me deitei no banco da praça porque a pequena comunidade que dividia comigo aquele território, naquele instante, optou por se sentar. Não quis ser revolucionária.
As bombas, os mísseis, as ogivas que estraçalham pessoas, aves, flora, comunidades, interferem no poderoso submundo ctônico, a mando de seres impensáveis… ficaram longe de mim naqueles pequenos e deliciosos instantes, minutos, que eu me dediquei.
Uma hora e meia, não mais do que isso. Mas um tempo investido no excepcional encontro de células vivas, sentindo cada instante de mim e de meu entorno. Sem interface.
Com respeito – palavra em desuso – a cada um dos seres vivos com quem eu habito o planeta que os experts do capital estão destruindo.
Estou me referindo à destruição provocada pelas guerras em curso, é bom que eu deixe claro. Porque a outra, aquela que há tempos vimos engendrando para que possamos nos desenvolver… esta fica até distante num momento em que indivíduos limitados, empossados, tomam as rédeas do mundo para destruí-lo. O que pensam? O que querem? O que sentem? Não ouso responder.
Mas ali, naquele mundo que me rodeava na pracinha do bairro, eu me dei conta de quão distante de mim estão esses seres do mal. E tive um lampejo de saúde, o ar fluiu melhor.
Aquela comunidade da pracinha do meu bairro estava unida em prol dos sentidos. Querendo pegar um solzinho para aquecer.
Cheguei em casa, tinha um recado. Solange, a vizinha artista que faz trabalhos lindos, estava fazendo um bolo! E me convidava, a mim e a outra vizinha, para nos reunirmos em volta dele, mais tarde. Beto, meu cachorro, estava convidado. Ele encontraria um par, o Bonitinho, cachorro de Solange e Jomar, seu companheiro.
Prometi levar hibisco seco para o chá. Acertamos o melhor horário. E lá fui eu, completar o dia me nutrindo de Ser. Meus neurônios deram uma festa, as proteínas dançaram, as células se animaram. Longe das telas um dia inteiro!
Lá a conversa foi sobre tudo o que importa. Sobre a vida. Pressão alta, pressão baixa, insônia ou não, quanto se dorme, quanto se pensa, é bom levar celular para o quarto? Sugeri a leitura de “24/7 O capital quer roubar seu sono”, de Johnathan Crary, e fui alimentada com outras tantas dicas.
Quando urbanistas defendem as cidades, eles falam sobre trocas. Os humanos só enriquecem – a riqueza que mais interessa – quando trocam com outros.
Dia desses, eu me sentei na pracinha aqui do bairro.
Não levei relógio, nem celular.
Éramos só eu, Beto, as pedras, algumas moscas, poucas folhas de poucos arbustos.
Rodeados pelo mundo ctônico, como diria Donna Haraway (“Ficar com o problema”) invisível aos meus olhos.
E muitos seres humanos que passavam, iam e vinham. Uns com pressa, outros nem tanto.
O que me levou a me sentar na pracinha foi o frio que comecei a sentir aqui em casa. Moro numa casa onde o sol não chega.
Aqui somos eu, Beto, o computador e minhas lembranças, algumas sob a forma de móveis, outras sob a forma de retratos, muitas sob a forma de livros e muitos enfeites que vou guardando pela vida afora.
Sabe aquelas coisinhas que a gente não consegue jogar fora? Pois é disso que estou falando.
Mas, voltamos à pracinha.
O sol foi me aquecendo, tirei as meias. Senti que o pescoço estava duro, fiz um movimento para soltar. Não sabia muito bem o que fazer com as pernas, ergui-as e fiz pose de Buda.
Sem tela para absorver minha atenção, passei a ouvir minha respiração, a me dar conta dos meus movimentos.
Fiquei assim até que veio uma certa moleza.
Não me deitei no banco da praça porque a pequena comunidade que dividia comigo aquele território, naquele instante, optou por se sentar. Não quis ser revolucionária.
As bombas, os mísseis, as ogivas que estraçalham pessoas, aves, flora, comunidades, interferem no poderoso submundo ctônico, a mando de seres impensáveis… ficaram longe de mim naqueles pequenos e deliciosos instantes, minutos, que eu me dediquei.
Uma hora e meia, não mais do que isso. Mas um tempo investido no excepcional encontro de células vivas, sentindo cada instante de mim e de meu entorno. Sem interface.
Com respeito – palavra em desuso – a cada um dos seres vivos com quem eu habito o planeta que os experts do capital estão destruindo.
Estou me referindo à destruição provocada pelas guerras em curso, é bom que eu deixe claro. Porque a outra, aquela que há tempos vimos engendrando para que possamos nos desenvolver… esta fica até distante num momento em que indivíduos limitados, empossados, tomam as rédeas do mundo para destruí-lo. O que pensam? O que querem? O que sentem? Não ouso responder.
Mas ali, naquele mundo que me rodeava na pracinha do bairro, eu me dei conta de quão distante de mim estão esses seres do mal. E tive um lampejo de saúde, o ar fluiu melhor.
Aquela comunidade da pracinha do meu bairro estava unida em prol dos sentidos. Querendo pegar um solzinho para aquecer.
Cheguei em casa, tinha um recado. Solange, a vizinha artista que faz trabalhos lindos, estava fazendo um bolo! E me convidava, a mim e a outra vizinha, para nos reunirmos em volta dele, mais tarde. Beto, meu cachorro, estava convidado. Ele encontraria um par, o Bonitinho, cachorro de Solange e Jomar, seu companheiro.
Prometi levar hibisco seco para o chá. Acertamos o melhor horário. E lá fui eu, completar o dia me nutrindo de Ser. Meus neurônios deram uma festa, as proteínas dançaram, as células se animaram. Longe das telas um dia inteiro!
Lá a conversa foi sobre tudo o que importa. Sobre a vida. Pressão alta, pressão baixa, insônia ou não, quanto se dorme, quanto se pensa, é bom levar celular para o quarto? Sugeri a leitura de “24/7 O capital quer roubar seu sono”, de Johnathan Crary, e fui alimentada com outras tantas dicas.
Quando urbanistas defendem as cidades, eles falam sobre trocas. Os humanos só enriquecem – a riqueza que mais interessa – quando trocam com outros.
Excelente, Amelia. Deverias reunir suas crônicas em um livro…
Lena!!! Pois acabo de fazer isto. O livro Ser Sustentável, editado pela Pirilampo, tem uma reunião de alguns dos meus textos. Está aqui, ó: https://www.editorapirilampo.com.br/produtos/ser-sustentavel-amelia-gonzalez/?srsltid=AfmBOoqdhYxzvvQqu5DrFlTjX2Cxo9fU3CUR1UShWCRj7CIlq7pSYQd4.
Grande beijo para você!
Muito bom saber! Vou pedir para minha sobrinha comprar no Brasil!
beijo grande