Aprendi com Edward Glaeser, especialista em economia das cidades, a rever minha antipatia pelo barulho e confusão das grandes metrópoles. Diz ele: “Acima de tudo, devemos nos libertar de nossa tendência de ver as cidades como sendo suas edificações e lembrar que a cidade real é constituída de gente e não de concreto”.
E gente, quando se junta por boas causas, quanta coisa boa produz.
Foi assim ontem pela manhã, quando peguei ônibus, metrô e VLT para desembarcar numa reunião do mais alto nível e de ótimas trocas. Cabeças pensantes, pessoas sensíveis, muita criatividade e conversa boa: eu estava na hora certa no lugar certo. Já me explico.
Fui ao Museu do Amanhã e participei de um encontro entre o gerente da Reserva Natural Vale, Marcio Santos Ferreira, e a equipe do Museu, tendo à frente o gerente de negócios do Instituto de Desenvolvimento e Gestão (IDG), Daniel Bruch. Fomos ciceronear uma visita de Marcio, que ainda carregava as malas da viagem Linhares (onde fica a Reserva)-Rio, ao Museu do Amanhã.
Sim, eu já visitei várias vezes o Museu. Mas tenho sempre a sensação de que cada vez é a primeira vez. Uma informação que eu nunca tinha ouvido, um pequeno e valioso objeto que lá sempre esteve e eu negligenciara em outras visitas.
Tem ainda as companhias, que sempre dão toques de riqueza diferentes às visitas. Aqui eu trago de novo a lucidez de Glaeser, que me faz entender que as cidades são ricas tanto mais pessoas abrigarem, já que os humanos, em parceria, tornam-se muito mais criativos.
Reavivei a lembrança do livro de Glaeser – “Os centros urbanos – A maior invenção da humanidade” (Ed. Campus, 2011) – justamente depois de “Nós”, o fim do percurso da Exposição Principal do Museu do Amanhã. Nosso pequeno grupo, ao som do burburinho feito por uma criançada esperta de uma das muitas escolas que visitam o Museu – desde a inauguração, 2015, até hoje, cerca de 700 mil pequenos uniformizados estiveram por lá – parou em frente ao Churinga.
Um simples pedaço de madeira magro e comprido, o Churinga é uma ferramenta utilizada pelos aborígenes australianos para associar o passado ao futuro. Ele representa a própria continuidade daquele povo e sua cultura. E está ali para suscitar reflexões sobre o futuro que queremos, já que “cada um de nós faz o seu Amanhã e, juntos, fazemos o nosso, o Amanhã que queremos”, diz o texto na peça que apresenta o Churinga aos visitantes. (Na foto abaixo, o Churinga e nosso futuro).

E é a única peça museológica existente no Museu do Amanhã, explicou-nos Bruch.
“Não somos um museu de contemplação, mas um museu que instiga perguntas”, disse ele.
E quantas perguntas somos capazes de formular a partir daquele pequeno pedaço de madeira.
Já dizia meu velho pai que não se dorme um dia sem ter aprendido algo novo. Ali estava eu, com as minhas caraminholas em polvorosa, refletindo e aprendendo muita coisa. Quando nos reunimos em torno de uma mesa, com água e café, foi o momento de ouvir ainda mais.
Para começar, sobre os conceitos diferenciados de museus. Marcio Ferreira representando um “museu de território”, a Reserva Natural Vale, 23 mil hectares de Mata Atlântica praticamente intactos em Linhares, no Espírito Santo; Daniel Bruch à frente de um “museu de ciências” que se autodenomina como “um ambiente de ideias, explorações e perguntas”.
Sem lugar à mesa, mas presente em nossas conversas, estavam os museus tradicionais, com objetos e obras de arte e pintura que nos levam a… contemplar.
Conversa vai, conversa vem, a folhas tantas Marcio Ferreira, desde sempre ligado às árvores e aos bichos que compõem nosso meio ambiente, olhando pela janela identificou, nos jardins do Museu, uma árvore Aroeira: “É a árvore que dá a pimenta rosa!”
E lá estávamos nós transportados para o Espírito Santo, já que a Aroeira é uma espécie muito presente no litoral capixaba. E tem sido bastante exportada para outros países.
A conversa fluía como fluem os pensamentos derivados de bons propósitos. E de pessoas ricas em ideias. Em pouco tempo, os dois museus, através de seus representantes, já estavam costurando formas de se conectarem. Tecnologia daqui, cuidados ambientais de lá, o bordado vai ficando ainda mais garboso porque há boas parcerias institucionais e elas são sempre bem-vindas. Alvíssaras!
Plenamente alimentados os pensamentos, a hora do almoço chegava e nos fazia querer nutrir também o corpo.
Fomos convidados a degustar uma refeição paraense da mais alta qualidade na Casa do Saulo, ali no espaço do Museu. Nossa conversa prosseguiu, animadamente cercada por iguarias como arroz com jambu, banana da terra assada, mapará grelhado, farofa de mandioca, humus de feijão… Ainda agora me vem água na boca ao lembrar dos sabores. Não pedi sobremesa porque já estava plenamente satisfeita, mas cá estou eu aqui a pensar no que perdi…
Hora de partir, para diminuir um pouco a minha pegada de carbono, que num dos dispositivos do Museu do Amanhã vi que está alta, peguei o excelente VLT, de novo o Metrô e de novo o táxi.
É um passeio imperdível, que aparentemente os criocas já estão dando o valor devido: só nesses quatro meses de 2023, 300 mil pessoas visitaram o Museu do Amanhã. Pretendo voltar mais e mais vezes, porque ainda me sobraram caraminholas…
Enquanto isto, vou ali a Linhares na semana que vem para conhecer a Reserva. Conto tudo na volta!